Skip to content

DE FILHO DO TROVÃO A APÓSTOLO DO AMOR

Filhinhos, não amemos de palavra, nem de língua, mas de fato e de verdade. (1 João 3.18)

 

A minha última leitura foi o livro de John MacArthur, “12 Homens Extraordinariamente Comuns”, obra que indico a todos os irmãos. Ao longo das páginas, o autor apresenta os apóstolos do Senhor Jesus e mostra como eram homens comuns, mas com um chamado extraordinário. Um dos capítulos que mais me chamou a atenção foi o quinto, que trata do apóstolo João. Talvez, depois de Pedro, João seja o mais conhecido entre os apóstolos de Cristo. Seus escritos são menores apenas que os de Paulo e Lucas. Além disso, tanto suas epístolas quanto o seu evangelho falam amplamente sobre o amor de Deus e sobre como Cristo é a maior manifestação desse amor. Em seus escritos, João utilizou a palavra amor mais de oitenta vezes, por isso é comumente conhecido como o apóstolo do amor. 

Apesar disso, quando lemos os Evangelhos, podemos perceber um João bem diferente daquele que mais tarde escreveria: “Deus é amor” (1 Jo 4.8). Junto de seu irmão Tiago, ele recebeu de Jesus o apelido Boanerges, que significa “filhos do trovão” (Mc 3.17). Esse apelido não foi dado à toa. João era intenso, apaixonado e, muitas vezes, precipitado. Foi ele quem quis que fogo descesse do céu para consumir os samaritanos que rejeitaram Jesus (Lc 9.54). Foi também quem repreendeu um homem que expulsava demônios em nome de Cristo, porque “não seguia conosco” (Lc 9.49).

Tudo isso deixa claro que João amava a verdade, mas ainda não compreendia que a verdade só é plena quando expressa em amor. Todos esses episódios demonstram que João era um servo piedoso, que realmente amava e zelava pela verdade, mas ainda o fazia com certa dureza. Isso provavelmente se deve ao fato de que João foi um homem formado em um contexto extremamente rígido. Afinal, ele e seu irmão tinham temperamentos muito parecidos: ambos desejavam uma posição de glória diante de Cristo, queriam assentar-se à Sua direita (Mt 20.20– 24) e, movidos pelo fervor da juventude, demonstravam pouca paciência, tolerância, compaixão e amor. João e Tiago cresceram às margens da Galileia; a vida no mar não os ensinou ternura, mas lhes deu a rudeza e o vigor comuns a todos os pescadores de seu tempo.

Todavia, a convivência com o Senhor Jesus transformou aquele zelo impetuoso em zelo compassivo. Note que o apóstolo não perdeu seu fervor por defender a verdade. Apenas a título de comparação, a palavra verdade aparece quarenta e cinco vezes em suas epístolas e em seu evangelho. O discípulo que antes queria destruir passou a consolar, o que queria calar os outros passou a servir a todos, tudo isso amparado pela verdade que tanto amava e defendia. Aos poucos, o “filho do trovão” foi moldado pelo “Filho do Amor”. Essa transformação não aconteceu por esforço humano, mas pela graça santificadora de Cristo. João aprendeu que amor e verdade não são opostos, mas duas faces de uma mesma fidelidade a Deus. O amor foi uma virtude que ele aprendeu de Cristo, e não algo que lhe era inato. 

Lembre-se ainda que quando escreveu suas epístolas, João já era um homem idoso, pastor provavelmente da igreja que Paulo plantou em Éfeso. Segundo a história da igreja, em seus últimos dias, já muito fraco, precisava ser carregado, e constantemente dizia: “Filhinhos, amai-vos uns aos outros.” Ainda assim, permanecia firme, denunciando as cristologias errôneas, as falsidades anticristãs, o pecado e a imoralidade. O apóstolo João sabia que era, sim, maravilhoso ser ousado e estrondoso, mas aprendeu que o amor é o equilíbrio necessário. Quando eu era mais novo, meus pais sempre me diziam que não era preciso ser ignorante para defender aquilo em que acreditamos. Essa foi a lição que João aprendeu, e que o Senhor também nos ensine esse equilíbrio: que o nosso zelo pela verdade jamais se torne dureza, e que o nosso amor nunca se torne conivência. Que sejamos, como João, transformados pela convivência com Jesus — do trovão à ternura, da impetuosidade à maturidade cristã.

                                                                                                                                                                                                                                     Pr. Matheus Brezolim.